O JULGAMENTO E A SOBERANIA PERTENCEM A DEUS
Diz
um ditado popular: "Antes de apontar um dedo para alguém, lembre que há
quatro apontados para você". Se esta simples recomendação fosse levada em
consideração, muitos mal entendidos seriam evitados. É impressionante como há
pessoas que se julgam acima do bem e do mal. Com isso não queremos dizer que
não temos a legitimidade de interpretar quando alguém está ou não agindo de
maneira dissimulada. Mas o que está em questão nesta seção bíblica de Tiago (4.11-17)
é o estilo de vida que a pessoa desenvolve sob a perspectiva de ser superior a
outra pessoa.
Nos
versículos 13-15, Tiago lembra-nos da brevidade da vida e da soberania de Deus
sobre ela. Quem é verdadeiramente o juiz perfeito, senão Deus? Nós somos simples
assistentes, e muitas vezes, os próprios réus necessitados do perdão divino.
Quanta misericórdia Deus teve por você, por mim e tantos outros seres humanos!
Torna-se uma tarefa impossível de relatar em alguma folha de papel tamanha
misericórdia e amor. Com a exceção da direção divina, a nossa vida é incerta e
breve. Hoje estamos vivos, mas amanhã podemos estar mortos. Por isso, quem
somos nós para posicionarmo-nos como juízes algozes de alguém?
Caro
professor, veja quanta riqueza de temas práticos podemos trabalhar nesta aula
com os nossos alunos! É imprescindível que os estimulemos a pensarem estas
questões práticas de maneira inteligente e franca. O tema da lição desta semana
é vivenciado por eles a cada dia das suas vidas. Não podemos desperdiçar a oportunidade
de convencermos os nossos alunos à adequarem as suas consciências à luz da
Palavra. Não é normal que as pessoas vivam julgando as outras, e nunca parem
para fazer um exame da própria consciência. Este exame pode ser feito de
maneira bem prática. Basta, no final de um dia, ao chegar em casa, perguntar-se
sinceramente: Hoje magoei alguém com o meu comportamento? Há dentro de mim
algum sentimento que reflete a ambição, o egoísmo e o prazer sórdido?
Essas
perguntas ajudam-nos a conhecer nós mesmos. Se as fizermos à nossa consciência
e respondermo-las com sinceridade não ficará pedra sobre pedra. Então, nos
conheceremos melhor, desenvolveremos uma autocrítica mais eficaz e teremos toda
a independência para odiar o pecado que tento nos assombra.
Revista
Ensinador Cristão CPAD, n°59, p.41.
COMENTÁRIO
INTRODUÇÃO
Neste capítulo,
abordaremos duas questões principais: o perigo de se fazer julgamentos
indevidos contra pessoas e a capacidade de reconhecer os atos de Deus em nossos
planos. Ambas as questões fazem parte do nosso dia a dia. Quem nunca emitiu um
juízo de valor sobre uma atitude ou sobre a vida de outra pessoa? E quem nunca
fez planos pessoais sem se lembrar de Deus? É sobre isso que discorreremos
aqui.
Alexandre
Coelho e Silas Daniel. Fé e Obras, Ensinos de Tiago para uma Vida Cristã
Autêntica. Editora CPAD. pag. 124.
Tiago começa o
capítulo 4 falando sobre uma guerra contra o próximo, contra nós mesmos e
contra Deus. Ele disse que as guerras entre as pessoas são um desdobramento das
tensões que temos dentro de nós mesmos. Ele disse que nessa luta contra Deus
enfrentamos a sedução do mundo (4.4), as paixões da carne (4.5,6) e as ciladas
do diabo (4.7). Tiago nos versículos 11, 12 mostra o risco de declararmos
guerra contra os irmãos, usando a língua para falar mal uns dos outros. Tiago
corrige esse grave pecado mostrando algumas coisas:
primeiro, como
devemos considerar uns aos outros: como irmãos e como o próximo (v. 11,12).
Segundo, somos irmãos, membros da mesma família, e Jesus é o nosso irmão mais
velho. Como próximo, devemos cuidar uns dos outros e não falar mal uns dos
outros. Terceiro, como devemos considerar a lei: Deus nos deu a lei para nos
orientar a amar uns aos outros (2.8). Se falamos mal, nós quebramos o preceito
da lei que devíamos obedecer. Se falamos mal, tornamo-nos juízes da lei e não
observadores dela. Quarto, como devemos considerar a Deus: Deus é o legislador,
o sustentador da vida e o juiz. Quando falamos mal do irmão pecamos contra
Deus. Quinto, como devemos considerar a nós mesmos: quando falamos mal do
irmão, colocamo-nos numa posição de superioridade (4.12).
Tiago, agora, nos
versículos 13-17, vai falar sobre o risco da presunção. A presunção vem de um
entendimento errado de nós mesmos e das nossas ambições. A presunção é assegurar
a nós mesmos que o tempo está do nosso lado e à nossa disposição. Presunção é
fazer os nossos planos como se estivéssemos no total controle do futuro.
Presunção é viver como se nossa vida não dependesse de Deus.
A presunção é um
sério pecado. Ela envolve tomar em nossas próprias mãos a decisão de planejar e
comandar a vida à parte de Deus. A presunção olha para a vida como um contínuo
direito e não como uma misericórdia diária.^^ A presunção atinge várias áreas:
toca a vida - hoje, amanhã, um ano. Toca as escolhas - “... hoje ou amanhã
iremos... passaremos um ano, negociaremos e ganharemos”. Toca a habilidade - “
negociaremos e ganharemos”.
Obviamente Tiago não
está combatendo a questão do planejamento, mas combatendo o planejamento sem
levar Deus em conta.^^ E claro que a vida é feita de nossas escolhas.
Precisamos ter alvos, planos, sonhos, mas não presunção.
Como nós podemos nos
proteger da presunção?
Em primeiro lugar,
tendo consciência da nossa ignorância. “No entanto, não sabeis o que sucederá amanhã”
(4.14).
Em segundo lugar,
tendo consciência da nossa fragilidade. “Que é a vossa vida? Sois um vapor que
aparece por um pouco, e logo se desvanece” (4.14).
Em terceiro lugar,
tendo consciência da nossa total dependência de Deus: “Em lugar disso, devíeis
dizer: se o Senhor quiser, viveremos e faremos isto ou aquilo” (v. 15).
Quais são os perigos
da presunção? A presunção envolve tomar em nossas próprias mãos o nosso destino
(4.16).
Também envolve uma
declarada desobediência ao conhecido propósito de Deus (4.17).
Podemos afirmar que a
vida humana está em certo aspecto sob o controle humano. Precisamos tomar
decisões e somos um produto das decisões que fazemos na vida: quem queremos
ser, com quem andamos, com quem nos casamos, o que fazemos. Por outro lado, a
vida humana, não está em nosso controle. Nós não conhecemos o nosso futuro nem sabemos
o que é melhor para nós. Devemos procurar saber quais são os sonhos de Deus
para a nossa vida. A verdade incontroversa é que a vida humana está sob o
controle divino.
Se Deus quiser
iremos, compraremos, ganharemos.
Tiago passa em
seguida a considerar a sublime questão da vontade de Deus (4.13-17). Warren
Wiersbe fala sobre as três atitudes que uma pessoa tem diante da vontade de Deus:
ignorá-la, desobedecê-la ou obedecê-la.
LOPES. Hernandes Dias. TIAGO Transformando provas em triunfo. Editora Hagnos. pag. 91-93.
A
maledicência é proibida (4.11-12)
A ligação
entre esta divisão e seu contexto não fica imediatamente clara. Pode ser que o
falar mal dos outros deva ser visto como uma manifestação do orgulho a que Deus
resiste (4.6) e que pode ser evitado pela humildade perante ele (4.10). Por
outro lado, “falar mal” (katalalia) está frequentemente associado com “inveja”
(;zelos; 2 Co 12.20; 1 Pe 2.1), “porfias” (2 Co 12.20), contendas (polemas, em
Salmos de Salomão 12.3) e orgulho (Testamento de Gade 33), sendo visto como uma
manifestação de duplicidade (Hermas, Similitude 8.7.2; veja Mandato 2). Por
fim, a proeminência da “lei” e do “julgar”, nos versículos lie 12, corresponde
ao tema de 2.8-13. Assim como Levítico 19.18 (o “mandamento do amor”) foi
citado ali, da mesma forma Levítico 19.16, que proíbe a calúnia, pode estar na
mente de Tiago aqui; a mudança de “irmão” para “próximo”, no verso 12, torna
isto bastante plausível. Estas várias possibilidades sugerem que os versículos
11 e 12 devem ser vistos basicamente como uma divisão independente que retoma
alguns dos temas prediletos de Tiago. Mas a proeminência da tradição que liga o
“falar mal” e os pecados da inveja, contenda e orgulho, que foram o centro de
3.13-4.10, sugere que, de modo geral, eles pertencem a esta discussão mais
ampla. Talvez os versículos 11 e 12 devam ser vistos como uma breve “reprise”
da discussão maior acerca dos pecados da língua, que iniciou a divisão
(3.1-12).
Douglas J. Moo. Tiago. Introdução e
Comentário. Editora
Vida Nova. pag. 150-151.
I - O PERIGO DE COLOCAR-SE COMO JUIZ (Tg 4.11,12)
1. A ofensa gratuita.
Mais uma vez, Tiago
aborda a questão da fala e o cuidado com aquilo que falamos. Sabemos que é
possível falar com as pessoas exortando-as, aconselhando-as e ensinando-as a
serem melhores e estarem mais próximas de Deus. Mas também é possível falar mal
das pessoas e atrair para si um duro julgamento.
Tiago trata do perigo
de nos colocarmos no lugar de Deus para exercer juízo contra uma pessoa. Mas de
que forma pode um servo de Deus aparentemente assumir a posição de juiz? Quando
abre a boca para falar mal de outras pessoas. O apóstolo não entra em detalhes.
Basta a ele apenas dizer que não devemos falar mal uns dos outros, pois quem
fala mal de seu irmão fala mal da lei, e por sua vez, quem fala da lei não é
mais observador, e sim juiz.
Timothy B. Cargal
comenta:
1) Ao condenar os
outros, estamos principalmente condenando a própria lei. Talvez Tiago
acreditasse que esse era o caso porque quando condenamos as pessoas estamos
condenando aqueles que foram “feitos à imagem de Deus” (3.9), e assim,
implicitamente, estamos condenando o próprio Deus (Cf. Rm 14.1-8, esp. w 4, 8).
2) Aqueles que julgam
seus semelhantes estão se posicionando como juízes acima da lei, em vez de
submeterem-se a ela (“se tu julgas a lei não és observador da lei, mas juiz”,
Tg 4.11).
Ao condenar os
outros, estamos nós mesmos sendo julgados e condenados pelo próprio Deus.
Quem pode realmente
criar a lei e aplicá-la? Tiago deixa claro que apenas Deus pode fazer essas
funções. Apenas Ele tem integridade suficiente para não ser movido por paixões
humanas. Podemos resumir o que Tiago fala da seguinte forma: Apenas Deus pode
fazer e executar a lei, mas se eu falo mal do meu irmão estou me colocando no
lugar de Deus (E Deus não fala mal de seus atos, pois são perfeitos!). Quem
critica seu irmão e fala mal dele vai ter de acertar as contas com Deus, pois
na prática está se colocando no lugar dEle. Dura é essa palavra, mas igualmente
verdadeira. Quão duro será o julgamento daqueles que se colocam no lugar de
Deus!
Tiago está dizendo
que a congregação não pode exercer um julgamento objetivo para agir de forma
disciplinar em alguns casos? Não, Tiago não está abordando esse fato. Ele, como
pastor principal em Jerusalém, sabia que a igreja tem o dever de agir de forma
sistemática e direta em alguns momentos. Ananias e Safira foram julgados
duramente por Deus, por intermédio de Pedro, e Paulo ordenou a exclusão do
crente coríntio que tinha relações sexuais com a mulher do próprio pai. Há
situações em que a igreja precisa ser enfática na forma como administra os
erros de seus membros, sob pena de se igualar ao mundo.
Claro que a
disciplina sempre deve ter os objetivos de corrigir e reabilitar. Não podemos
lançar no mundo uma pessoa que Jesus salvou, mas não podemos também compactuar
com um pecado cometido, como se nada de errado houvesse ocorrido. Portanto,
antes de exercer a disciplina no tocante a um pecado de um membro da
congregação, a igreja deve se certificar de que ensinou àquela pessoa sobre
aquele assunto, se ela entendeu, e posteriormente, se incorre no erro, deve
passar pelo processo de disciplina para ser corrigida e reabilitada na
congregação.
Aqui cabe uma
observação. E importante que o novo crente tenha a consciência de que a igreja
como instituição possui normas específicas de comportamento e convivência para
seus membros. Essas normas têm por objetivo fazer com que a convivência entre
os congregados possa ser mais amigável, em clima de respeito e
confraternização, e também para que a liturgia do culto possa ter uma
metodologia que favoreça o respeito pelo sagrado. Um culto em que cada pessoa
faz o que quer acaba se tornando uma bagunça, e como Deus não é Deus de
confusão, mas um Deus ordeiro e que preza pelo culto racional, o nosso culto
deve seguir esse princípio. E as normas da igreja devem ser pautadas na Palavra
de Deus e no bom senso, pois os costumes variam de povo para povo, conforme a
época e o lugar, mas a Palavra de Deus é imutável.
E evidente que não é
sobre esse tipo de julgamento que Tiago está falando, e sim sobre o ato de uma
pessoa da congregação emitir de forma gratuita e indevida uma opinião sobre uma
outra pessoa. E isso deve nos levar à reflexão: é correto falar mal de outra
pessoa? Ou invertendo os poios, como eu agiria se soubesse que meu nome foi
citado em uma conversa, sendo mal falado ou tendo minha imagem denegrida de
forma indevida e injusta? Da mesma forma que eu gostaria de ser tratado, deve
igualmente tratar. Se não desejo ver meu nome sendo citado de forma negativa,
devo conter meus lábios para não incorrer no mesmo erro.
Alexandre
Coelho e Silas Daniel. Fé e Obras, Ensinos de Tiago para uma Vida Cristã
Autêntica. Editora CPAD. pag. 124-128.
Pv 18.19 O irmão
ofendido resiste mais que uma fortaleza. O hebraico original, neste versículo,
é dificílimo de compreender, se não mesmo impossível; por isso também vários
significados têm sido sugeridos, dentre os quais destacamos dois:
1. Fala-se aqui (tal
como diz a King James Version) de um irmão ofendido. É mais difícil
“conquistá-lo de volta” para a amizade do que capturar uma cidade forte. As
pessoas sentem muito as ofensas e tornam-se duras de coração, não querendo
reconciliar-se.
2. Ou então o irmão é
ajudado (Revised Standard Version), conjectura feita pela Septuaginta sobre o
que este versículo quer dizer. Temos de lembrar que essa versão da Septuaginta
foi traduzida por judeus eruditos de Alexandria, que deveriam ser excelentes
conhecedores do idioma hebraico. Se o significado, realmente, for o do irmão
ajudado, devemos compreender que essa ajuda fará desse homem um aliado (e não
um inimigo), e ele se tornará uma cidade forte. A versão siríaca e a Vulgata
Latina, bem como o Targum, concordam com essa tradução. Adicione-se a isso a
tradução da Imprensa Bíblica Brasileira. Mas a nossa versão portuguesa — a
Atualizada — fica com a primeira possibilidade.
Sinônimo ou Antítese.
Se estiver correta a primeira significação, acima, então a segunda linha do
provérbio fortalece a ideia com uma adição sinônima. As divergências entre
irmãos (amigos) tornam-se como as barras que guardam um castelo e não podem ser
quebradas. Em outras palavras, a disputa nunca será solucionada, e a alienação
tornar-se-á permanente. Mas, se está correto o segundo sentido, que se vê
acima, então a segunda linha métrica forma uma antítese. Em contraste com a boa
união entre irmãos (amigos), haverá a contenda que separa e aliena, e, como as
barras de um castelo, não podem ser quebradas. “A amargura das querelas entre
ex-amigos é proverbial” (Ellicott, in loc.).
A situação ideal é
esta: Irmãos unidos são mais fortes do que um castelo; eles resistem juntos com
maior vigor do que as barras de ferro de proteção de um castelo.
CHAMPLIN, Russell
Norman, Antigo Testamento Interpretado
versículo por versículo. Editora Hagnos. pag. 2630.
Observe: 1. Deve-se
tomar grande cuidado para evitar contendas entre parentes, e os que têm algum
compromisso especial, uns com os outros, não somente porque estas contendas são
pouco naturais e totalmente inconvenientes, mas porque entre estas pessoas as
coisas são normalmente ditas e recebidas com muita crueldade, e os ressentimentos
vão longe demais. A sabedoria e a graça, na verdade, devem fazer com que nos
seja fácil perdoai’ nossos parentes e amigos, se nos ofendem, porém a corrupção
faz com que nos seja muito difícil perdoá-los; devemos, portanto, tomar cuidado
para não afrontar um irmão, ou alguém que nos seja como um irmão - a ingratidão
é uma grande provocação. 2. Devem ser feitos grandes esforços para decidir as
questões que geram divergências entre os parentes, o mais rapidamente possível,
porque é algo de extrema dificuldade, e, consequentemente, é muito honroso que
seja feito. Esaú foi um irmão ofendido, e parecia mais difícil de conquistar do
que uma cidade forte. mas. por uma obra de Deus em seu coração, em resposta à
oração de Jacó, ele foi conquistado.
HENRY.
Matthew. Comentário Matthew Henry Antigo
Testamento Jó a Cantares de Salomão. Editora CPAD. pag. 815.
2. Falar mal dos outros
e ser juiz da lei (Tg 4.11).
Tg 4.11 Com uma
brusca mudança de assunto, da descrição de uma atitude apropriada perante Deus,
Tiago passa para as relações apropriadas entre os crentes. Nós amamos a Deus
sendo humildes diante dele; nós amamos o nosso próximo recusando-nos a falar
mal uns dos outros. Falar mal é algo que pode ser feito de várias maneiras. Nós
podemos falar a verdade sobre uma pessoa e ainda assim sermos desagradáveis, ou
podemos espalhar mexericos que os outros não precisariam ficar sabendo.
Podemos estar
questionando a autoridade de alguém, ou anulando as suas boas obras por meio de
calúnias. Isto, obviamente, destrói a harmonia entre os crentes (veja também Rm
1.29,30; 2 Co 12.20; 1 Pe 2.1). O tempo do verbo no texto grego revela que
Tiago está proibindo uma prática que já está em andamento. As pessoas já tinham
o hábito de criticar umas às outras.
Este versículo inclui
a sexta e a sétima vez em que Tiago menciona a lei de Deus nesta carta (veja
1.25; 2.8-10,12). Trata-se da lei real - a lei que liberta ou condena, a lei
que deve ser observada. Aqui a lei está sendo atacada. O problema específico
que está sendo confrontado infringe o nono mandamento: “Não dirás falso testemunho
contra o teu próximo” (Êx 20.16).
Ele também infringe a
lei mais fundamental de Cristo: “Amarás o teu próximo como a ti mesmo” (Mt
22.39; veja também Lv 19.18).
Jesus designou este
mandamento como sendo o segundo maior mandamento (Mc 12.31). Se um crente fala
contra outro crente, ele fala mal da lei e julga a lei, porque não está
mostrando amor e não está tratando os outros como gostaria de ser tratado. A
sua desobediência mostra desrespeito pela lei, pois ele está julgando a sua
legitimidade. Ao fazer isto, ele está se colocando acima de Deus. Quando julgamos
os outros desta maneira difamadora, estamos claramente deixando de nos submeter
a Deus.
Comentário do Novo
Testamento Aplicação Pessoal. Editora CPAD. Vol. 2. pag. 687.
Tg 4.11 «...não
faleis mal uns dos outros...» No grego é usado o termo «katalaleo», que quer
dizer «falar mal de», «degradar», «difamar». Esse termo é frequentemente
aplicado ao ato de dizer palavras duras contra os ausentes, os quais, por isso
mesmo, não podem defender-se. No entanto, não temos de entender aqui,
necessariamente, tal elemento. Notemos o imperativo presente. E como se Tiago
tivesse dito: «Não tenhais por hábito, conforme vindes fazendo, de difamar a
outros, pôr qualquer razão. A maior parte dessa difamação provavelmente está
vinculada a supostas «criticas pias», daqueles que não praticavam a «Torah» (a
lei), conforme podia esta ser entendida no seio do cristianismo. Isso proíbe a
maledicência e os boatos, que se originam do ódio e do despeito. Trata-se de um
uso impróprio da fala, dando a entender que quem assim faz busca suplantar a
lei, que é o verdadeiro agente condenador nas mãos de Deus. (Ver Efé. 5:4
quanto .a notas expositivas sobre o uso apropriado da faculdade da fala. Quanto
a outras passagens bíblicas que têm o mesmo sentido geral contra a fala
prejudicial ao próximo, ver Sal. 101:5; II Cor. 12:20; I Ped. 2:1; Rom. 1:30.
Quanto à primitiva literatura cristã, ver Clemente, Romanos 30:1,3; 35:5; II
Clemente, Romanos 4:3; Hermas, Sim. vi.5:5; viii.7:2; ix.26:7; Mand. <7,2;
Bamabé 20; Testamento dos Doze Patriarcas, Gade, 3:3 e 5:4).
«O que está em foco
aqui é a indulgência daqueles que falam sem gentileza. Nada indica que qualquer
outra coisa está em foco, do que a crítica dura, comum na vida diária da
antiguidade e de nossos dias. Não há aqui um ensino diretamente dirigido contra
os mestres, que se mordiam entre si. Quanto a tal ponto de vista, com o de
Pfleiderer, por exemplo, que pensava ver aqui uma polêmica contra a atitude de
Márciom, que julgava a lei judaica inferior, não há qualquer confirmação, como
também se dá no caso da ideia (esposada por Schneckenburger), de que há aqui a
repreensão contra aqueles que atacavam o caráter de Paulo por suas costas».
(Ropes, in loc.).
«...fala mal da lei...»
De que maneira? 1. Ignorando seus mandamentos contra o tratamento maldoso
contra outros, em que fica ferida a lei do amor. Quem age assim, viola a régia
lei do amor (ver Tia. 2:8 e o contexto, vinculado a Lev. 19:18, bem como aquele
versículo que ordena o amor ao próximo). Ele declara que a lei é «sem valor e
sem aplicação», no seu próprio caso, desobedecendo-a e desconsiderando-a cruelmente. 2.
Também fica implícito que a lei não é juiz suficiente, porque presumia tornar-se
juiz, em lugar da lei. Desse modo, tal indivíduo degradava à lei, como um
instrumento nas mãos de Deus, que realmente critica e julga.
«...julga a lei...»
Tal indivíduo julga a lei ao «avaliá-la». Ele lhe dava pouco valor, reputando-a
inútil, como as suas ações. É como se ele dissesse: «A lei não serve de juiz,
pelo que tenho de ocupar suas funções». Assim sendo, dá à lei uma avaliação
muito inferior. E também julgava a lei errônea, ao repreender aqueles que
faziam mal ao próximo, como se ele fosse o real juiz das ações morais corretas.
Ainda que tal pessoa não o declarasse, suas ações assim dão a entender. E
talvez não agisse conscientemente, mas suas ações equivaliam à rejeição
consciente da lei como autêntico juiz dos homens. O autor sagrado, naturalmente,
pensava na lei segundo os moldes cristãos, conforme ele faz por toda esta
epístola, o que é perfeitamente óbvio na secção de Tia. 2:14 e ss. Ao julgar a
lei de Deus como algo sem valor, tal indivíduo tomava o lugar de Deus como
juiz. Mas somente Deus é um juiz infalível (ver o décimo segundo versículo e o
trecho de I Cor. 4:3-5); mas esse indivíduo presume negar essa proposição por
meio de suas ações. Nesse processo, chega bem perto da blasfêmia, e certamente
se torna um elemento prejudicial na comunidade religiosa.
«...se julgas a lei,
não és observador da lei...» Todos os homens são chamados para serem
observantes da lei. Porém, quando um homem se exalta tanto que imagina poder
julgar à lei, considerando-a inútil, dificilmente haveria de praticá-la. Sua
própria atitude altiva o torna transgressor da lei; sua presumida
auto-exaltação o torna um transgressor; ele degrada seu irmão, e isso o torna
transgressor, porquanto ignora a principal característica da lei, o «amor».
Tornou-se um homem eivado de preconceitos.
«...mas juiz...»,
isto é, juiz acima da lei, como quem substituiu a lei. Já que Deus se utiliza
da lei em seus juízos morais sobre as ações humanas, esse indivíduo, na
realidade, pensa em suplantar a Deus. Sua atitude preconcebida, portanto, perdeu
inteiramente o controle. Esse homem pensa que é a fonte do direito e da
bondade, estando qualificado, por conseguinte, a julgar aos outros. Fez de si
mesmo um Deus falso. É um juiz hostil à lei e ao Deus da mesma, sendo o pior
tipo de depravado. E também é «juiz» por que «condena à lei», já que a
considera «sem valor», tomando seu lugar. Porém, as outras ideias parecem mais
centrais, já que esse pensamento já havia sido expresso neste versículo. O
versículo seguinte mostra-nos o absurdo de qualquer homem que se presume um
juiz. Só existe um ser que está qualificado a tal trabalho—o qual possui
inteligência e poder divinos. Outrossim, o verdadeiro juiz também é o
«legislador». Em contraste com isso, esse homem nega a lei que foi dada,
tornando-a inútil, ao viver de modo contrário a seus mandamentos, procurando
impor suas ideias a outros.
CHAMPLIN, Russell
Norman, O Novo Testamento Interpretado
versículo por versículo. Editora Candeias. Vol. 6. pag. 68.
O ser humano que se
tornou culpado e que acaba de ser erguido do chão pelo Senhor com sua clemência
e presenteado com seu perdão e todo o seu amor, não pode em absoluto se arvorar
imediatamente em juiz sobre outros (cf. Mt 18.23-34). Por isso Tiago, no
contexto da palavra “Humilhai-vos perante o Senhor, e ele vos exaltará”, aborda
mais um ponto na vida da igreja, o julgamento sobre outros.
1 – As más línguas
(v. 11)
Tg 4.11 “Irmãos, não
faleis mal uns dos outros”: muito concreta é a tradução de Lutero: “Não faleis
pelas costas”, ou seja: não faleis “por trás” uns dos outros. Alguém acaba de
passar, e nem sequer se distanciou, duas pessoas já começam a comentar… Quando
falamos sobre outros em tom de condenação, corremos o perigo de rapidamente
perder a atitude do v. 10: “Humilhai-vos perante o Senhor.” Quem julga eleva-se
sobre os demais e se arroga o direito de sentenciá-los, bem como de assumir uma
posição especial diante de Deus. Assim tornamos a abrir as portas ao espírito
falso.
“Não faleis mal uns
dos outros”: nesse aspecto a legislação estatal não concede uma proteção legal
sólida. A propriedade da pessoa é muito mais firmemente protegida pelas leis
penais que seu bom nome. Quando alguém penetra na casa pela janela da sala e
furta um objeto de um armário chaveado ele é perseguido como arrombador. No
entanto, quem dissemina um boato maldoso de maneira intencional e com as
necessárias cautelas, ou seja, quem rouba o bom nome de outra pessoa e assim o
prejudica de forma muito mais grave, não é perseguido pela promotoria (a
possível queixa pessoal constitui uma proteção legal frágil e, em certas
circunstâncias, também dispendiosa). Consequentemente, a difamação possui
grande importância no mundo: dessa maneira é possível neutralizar o rival no
local de trabalho, prejudicar o concorrente comercial e liquidar o adversário
político.
“Não faleis mal uns
dos outros, irmãos”: Tiago dirige-se a cristãos. Talvez eles pensem que já
progrediram muito na obediência da fé, na santificação de sua vida. Não
obstante, esse desvio ainda se conserva neles. Temos de admitir que também
entre nós ainda persistem deficiências. – Podemos nos perguntar por que,
afinal, um ser humano, inclusive um cristão, gosta tanto de dizer e ouvir
maldades sobre outros: o outro se torna o pano de fundo escuro diante do qual
nós nos destacamos de modo bem mais vantajoso. Tranquilizamo-nos em relação a
nossos próprios erros. E quando o outro é um rival, isso nos proporciona uma
posição melhor na corrida. Tudo isso, porém, procede do espírito falso. Ele
praticamente se trai através dessa atitude.
2 – A profissão
usurpada.
“Quem fala mal do
irmão ou julga seu irmão…”: Ou seja, em certas situações nos sentamos na
cátedra do juiz, e nosso irmão deve se assentar no banco dos réus. Contudo,
estamos no lugar errado. Igualmente perseguimos um objetivo errado. A palavra
para “julgar” no grego, krinein, também significa “separar” e “segregar”. No
entanto, ainda não é hora para isso. O próprio Deus ainda não o faz. Paulo
afirma: “Não julgueis antes do tempo” (1Co 4.5). Agora não é hora de separar
(Mt 13.28-30,47-50), mas de arrebanhar, de evangelizar. Do mesmo modo é tempo
de cuidado pastoral, por meio do qual a pessoa é liberta com paciência do mal
que – se perseverar nele – o separaria eternamente de Deus (Gl 6.1). Nosso
Senhor cuida pessoalmente dessa obra. Temos o privilégio de sermos
colaboradores de Deus (1Co 3.9). O crente espera com Deus em favor do próximo.
3 – Quem julga
critica a Deus e seu mandamento.
Quem se propõe a
julgar agora critica a Deus pelo fato de que ele – conforme acabamos de ver –
ainda tem paciência. – “E julga também a lei”: os mandamentos de Deus não
representam para a igreja de Jesus Cristo o dever que lhe cabe cumprir antes de
poder realmente se aproximar de Deus (cf. o exposto acerca de Tg 2.14). E
tampouco são o meio para excluir dois terços dos membros de nossas igrejas e
congregações. Jesus afirma: “Deixai-os crescer juntos até a colheita” (Mt
13.30). Pelo contrário, o mandamento de Deus é para nós a vontade santa e
salutar de Deus, misericordiosamente revelada, a boa e benfazeja ordem doméstica
dos filhos que estavam perdidos e já retornaram ao lar do Pai. No entanto,
quando tentamos usar de outro modo os mandamentos de Deus, nós criticamos a
eles, e também àquele que os outorgou, bem como aquilo para o que os está
concedendo agora. – Igualmente se exerce “crítica” (a palavra também se origina
do grego krinein – “julgar”, “separar”) quando se faz diferença entre os
mandamentos de Deus: pretendemos nos empenhar vigorosamente em favor de um
(porque parece se dirigir contra outros), ao passo que de forma alguma
observamos o outro, o Oitavo Mandamento, que fala contra nós.
Tiago nos obriga a
levar o raciocínio até o fim: logo “não és observador da lei, mas juiz”. O
praticante situa-se sob o mandamento, em obediência, sob o próprio Deus. Ele é
o humilde, para o qual vale a promessa do v. 10. “Quem se humilha será
exaltado” (Lc 14.11). Quem, porém, posa de juiz da lei de Deus, criticando-a
(indireta ou diretamente) e colocando arbitrariamente suas ênfases,
eleva-se acima dos
mandamentos e daquele que os concedeu. Para esse vale a palavra: “Deus resiste
aos soberbos” (v. 6). “Quem se exalta será humilhado” (Lc 14.11). Hoje muitas
vezes se exige a crítica, também na igreja. Em certa medida isso tem razão de
ser. Mas de forma alguma poderá evoluir para crítica à palavra de Deus e à sua
natureza compromissiva. A palavra de Deus critica a nós, e não nós, a ela. Do
contrário permitimos que o espírito de baixo se instale, sendo arrastados, à
moda do anticristo, para a queda e o orgulho do inimigo.
Fritz
Grunzweig. Comentário Esperança Carta De
Tiago. Editora Evangélica Esperança.
3. O autêntico
Legislador e Juiz pode salvar e destruir (Tg 4.12).
Tg 4.12 Há só um
Legislador (a origem da lei) e um Juiz (que faz a lei vigorar). Nós, que somos responsáveis
diante da lei de Deus, não podemos nos colocar no lugar de Deus.
Deus recompensa
aqueles que obedecem à lei e destrói aqueles que a desobedecem (veja Dt 32.39;
1 Sm 2.6; Sl 68.20; 75.6,7; Mt 10.28).
Tiago também remove
qualquer direito que pudéssemos reivindicar de criticar o nosso próximo. Por
trás do espírito de crítica, está uma atitude que usurpa a autoridade de Deus e
que está repleta de orgulho. Não deve haver críticas ásperas e severas no corpo
de Cristo. O princípio, neste versículo, não proíbe a ação adequada de uma
igreja contra um membro que está agindo em flagrante desobediência a Deus (1 Co
5.6). Na verdade, Tiago está preocupado com as palavras críticas que condenam
ou julgam as ações dos outros e a sua posição perante Deus. Ele está confrontando
as pessoas que poderiam ser tentadas a se colocar como cães de guarda, vigiando
os outros crentes.
Podemos pensar que
simplesmente criticar um membro da igreja ou espalhar um mexerico pouco
interessante não seja algo tão grave - especialmente em comparação com outros
pecados. Mas a Bíblia vê isto como um pecado de suma gravidade, porque infringe
a lei do amor e tenta usurpar a autoridade de Deus. Como vimos no capítulo 3, a
língua é um instrumento de pecado mortal. Não ousemos minimizar o perigo que
ela representa.
Comentário do Novo
Testamento Aplicação Pessoal. Editora CPAD. Vol. 2. pag. 687.
Tg 4.12 «...salvar e
fazer perecer...» O trabalho próprio de um Juiz ê algo inteiramente fora da
capacidade do homem, pois aborda a solenidade suprema. Envolve a doação da vida
ou seu contrário, quando é imposta a morte espiritual.
É óbvio que somente o
Ser supremo está qualificado para essa gigantesca tarefa. Mediante tal
argumento, o autor sagrado toma o seu caso invencível contra aqueles que
queriam ser juízes, ou seja, contra a atitude de censura ao próximo,
especialmente quando alguém presume dizer quem é digno ou não do nome de
«discípulo de Cristo».
«...tu, porém, quem
és... ?»Essa é uma observação ferina. Quem és tu, na realidade, que presumes
possuir tal responsabilidade? Apenas te tornas ridículo! Devemos sujeitar-nos
totalmente a Deus, porquanto ele é nosso único Juiz, sem haver outro.
Deus, o Juiz, é capaz
de salvar ou de condenar, e evidentemente essa era uma maneira comum, na
terminologia judaica, de se referirem os judeus ao Ser Supremo. O N.T. com
frequência atribui a Jesus Cristo o papel de Juiz, por delegação de Deus Pai.
(Ver Atos 17:31). O autor sagrado mui provavelmente sabia disso, não se tendo
incomodado, porém, de descer a detalhes da questão. Mas certamente ele indica
aqui que Deus Pai é quem é o Juiz.
O problema de não
julgar: O texto não é contra a ideia de fazermos juízos morais, de tentar
ajudar a outros a corrigirem os seus caminhos tortuosos. É óbvio que se um
crente não pudesse fazer aquilatações dessa natureza, dizendo, «Irmão, você
está errado nisto ou naquilo», então a instrução cristã se tornaria vaga e
inoperante. Nada existe no texto à nossa frente que tire a severidade da
instrução ou da reprimenda morais. Contudo, quando vemos um irmão em uma falta
flagrante, devemos procurar «restaurá-lo» com amor e paciência (ver Gál. 6:1).
Aquele que age assim, de acordo com o mesmo versículo, compreende o tempo todo,
que ele mesmo poderia cair no mesmo erro, não sendo tão superior e elevado que
esteja acima da mesma forma de tentação. O que o texto condena, pois, é a
atitude de censurar, que degrada a outrem, ao mesmo tempo que exalta a si
mesmo, ou que profere críticas negativas, que não edificam, mas apenas
degradam. Ao mesmo tempo, tais pessoas geralmente exaltam a si mesmas,
desfazendo da realidade do discipulado cristão de outrem. Toda a censura ou
crítica negativa, pois, é atitude condenada. Algumas vezes, infelizmente, há
uma linha divisória muito estreita entre a critica positiva e a crítica
negativa, até onde podemos ver as coisas. Deus é quem conhece a diferença. A
critica positiva se dá quando um crente, no espírito de amor, busca ajudar a um
outro por aquilo que diz, e aprende a dizê-lo com gentileza, sem motivo
ulterior de auto-exaltação. A crítica negativa se verifica quando o indivíduo
não se importa realmente em ajudar a outro, mas antes, se aproveita da ocasião
para fazer o outro parecer errado, e ele mesmo, bom, em contraste. Essa forma
de crítica ocorre quando o indivíduo age a fim de prejudicar ou humilhar. Se
procuramos prejudicar e humilhar a outros, embora criticando o que está de
acordo com os fatos, eventualmente seremos prejudicados e humilhados, pelas
línguas venenosas de outros. E assim é verdade aquele declaração:
Não basta que o teu
conselho seja verdadeiro;
A verdade crua
prejudica mais que a falsidade aberta.
(Alexander Pope, Essay on Criticism).
(Ver também as notas
expositivas em Tia. 3:2 e 6, onde são dadas citações e ilustrações, apropriadas
para a presente secção, constante dos versículos onze e doze deste quarto
capítulo da epístola de Tiago).
CHAMPLIN, Russell Norman,
O Novo Testamento Interpretado versículo
por versículo. Editora Candeias. Vol. 6. pag. 69.
Tg 4:12 Tiago
sublinha sua tese ao afirmar ousadamente: Há um só legislador e juiz.
Ensinou-nos Jesus que só Deus tem autoridade para julgar (João 5:22-23,30), e
todo judeu sabia que foi Deus quem outorgou a lei. Acrescenta Tiago: aquele que
pode salvar e destruir, isto é, “porque nem do oriente, nem do ocidente, nem do
deserto vem a exaltação. Mas Deus é o juiz; a um abate, e a outro exalta” (Salmos
75:6-7). Portanto, as duas características seguem juntas. Deus outorgou a lei;
Deus faz cumprir sua lei. Sendo soberano único, tem autoridade sobre a vida e a
morte.
Tu, porém, quem és,
que julgas ao próximo? Se foi Deus quem outorgou a lei, e se só Deus é juiz,
como ousa alguém estabelecer-se como juiz, mediante sua língua ferina? O
criticismo usurpa a autoridade de Deus, como diz Paulo: “Quem és tu que julgas
o servo alheio? Para seu próprio Senhor ele está em pé ou cai. Mas estará
firme, pois poderoso é Deus para o firmar” (Romanos 14:4). Portanto, por detrás
do espírito crítico está o orgulho. O crítico orgulhoso, em vez de humildemente
olhar para sua própria necessidade da graça, usurpa o papel que só cabe a Deus
e instala-se como juiz das outras pessoas, como se seu julgamento fora idêntico
ao julgamento vindo de Deus, e tivesse grande valor.
Peter
H. Davids. Comentário Bíblico
Contemporâneo. Editora Vida. pag. 136-137.
II - A BREVIDADE DA VIDA E A NECESSIDADE DO RECONHECIMENTO DA
SOBERANIA DIVINA (Tg 4.13-15)
1. Planos meramente
humanos (Tg 4.13).
A Carta de Tiago
apresenta outro assunto muito corrente em nossos dias: o fazer planos para o
futuro. Qual é a concepção de Tiago? Ele entende que podemos fazer planos,
desde que dependamos de Deus para realizá-los.
O apóstolo compara a
vida humana a um vapor ou fumaça, que se desvanece em pouco tempo. Por causa da
brevidade da nossa vida, não somos impedidos de planejar o futuro, mas sim
excluir Deus dos nossos planos.
Apresentando nossos
planos a Deus
Tiago escreve: “...Se
o Senhor quiser, e se vivermos, faremos isto ou aquilo”. Para alguns pregadores
modernos, essas palavras de Tiago deveriam ser retiradas do texto. Não são
poucos os púlpitos de nossas igrejas em que mensagens empolgantes orientam os
crentes a colocarem Deus contra a parede, “obrigando” o Eterno a realizar
sonhos e desejos de riquezas e poder. Esse tipo de atitude deturpa o verdadeiro
evangelho. Disse certa vez Isael de Araújo, autor da célebre obra Dicionário do
Movimento Pentecostal: “Deus não vai julgar o que o evangelho faz conosco, mas
vai julgar o que fazemos com o evangelho”. Deus não é um escravo à disposição
de satisfazer nossos desejos. Ele é o Senhor, e nós, seus servos. Não podemos
tentar constranger Deus a realizar nossos desejos e ignorar a vontade divina
para nossas vidas.
Tiago chama a atenção
de seus leitores sobre a realidade do fato de que não podemos controlar a nossa
própria vida. Pelo texto, Tiago parece descrever algumas atividades
relacionadas à vida de membros da congregação. São atividades aparentemente não
relacionadas à vida eclesiástica: viajar para determinada localidade, lá
residir por um ano, fazer contratos, estabelecer negócios e ganhar dinheiro.
Deus preza pelo
trabalho? Sim. Ele espera que com seu fruto possamos angariar recursos para
nossa subsistência e daqueles que dependem de nós. Se ganhamos a vida de forma
honesta, não temos nada a temer.
Deus condena
planejamentos? Claro que não. Se olharmos para os dias da Criação, veremos que
Deus planejou primeiro o ambiente em que o homem seria colocado, e depois de
esse ambiente ser criado, Deus criou o homem. Ele proveu a terra de todos os
recursos para a vida humana, e depois estabeleceu a humanidade. Ele não fez o
caminho inverso. Por isso, tudo em nossa vida precisa de um direcionamento, um
planejamento: onde quero chegar, por qual caminho vou chegar, quanto tempo
levarei para chegar e quais recursos precisarei ter para essa finalidade.
Tiago, de forma
direta, nos desafia a incluir Deus em nossos planos, e de forma indireta nos
ensina que isso implica a busca pela vontade de Deus em nossas vidas. Se temos
de fazer planos, devemos fazê-los de acordo com os projetos de Deus para nós.
A Bíblia não é um
livro de curiosidades que diz com quem uma pessoa solteira vai se casar, se vai
chover hoje ou amanhã, ou ainda, o tipo de profissão que devo seguir ou quantos
filhos devo ter. Há muitas situações em que Deus nos permite usar nosso bom
senso, analisar aquilo de que dispomos e seguir uma carreira de acordo com
nossos talentos pessoais, e isso não é pecado. Mas não é certo deixar de
apresentar a Deus nossos planos. Na prática, isso não significa que Deus não
saiba o que queremos, pois Ele sabe o que vamos pedir antes mesmo de orarmos.
Porém, nossos planos devem estar sujeitos a Deus, até mesmo quando Ele nos diz
um necessário “não”.
Lembre-se também de
que a minha obediência a Deus hoje pode garantir a orientação divina no futuro.
Pensemos no caso do rei Saul. Ele foi escolhido por Deus, ungido, e até
profetizou, mas com o passar do tempo se tornou um homem rebelde a Deus e à sua
orientação, e Deus deixou de falar com ele. No final de sua vida, Saul foi
procurar uma feiticeira para se consultar, porque Deus não mais falava com ele.
Há uma lógica nesse fato? Sim. Se eu confio na orientação de Deus e a obedeço
hoje, Deus certamente continuará a me orientar, pois sabe que eu não apenas
ouço sua voz, mas a obedeço também. De nada adianta buscar a orientação divina
se eu não tenho a menor intenção de obedecê-la.
Outro caso foi o do
rei Josafá, diante de uma batalha, em 2 Crônicas 18. Acabe, o rei ímpio de
Israel, procurou Josafá para que ambos se aliassem em uma batalha, e Josafá foi
consultar ao Senhor. Deus o respondeu por intermédio do profeta Micaías, mas
Josafá ignorou a Palavra do Senhor. Por ter ouvido a Palavra
de Deus e tê-la
ignorado no tocante à aliança com Acabe, Josafá foi duramente repreendido pelo
Senhor. Na prática, podemos escolher ouvir a Palavra de Deus e obedecê-la ou
ignorá-la, mas os resultados sempre seguem as pessoas nos dois casos, òauí se
tornou um rei rebelde e perdeu o reino, além de ter se tornado uma figura mal
vista nas Escrituras. Josafá foi repreendido pelo Senhor, coisa que não
ocorreria se tivesse obedecido a Deus.
Podemos evitar muitos
problemas em nossas vidas quando decidimos buscar ao Senhor e obedecer-lhe a
voz. Deus não é contra fazermos planos, mas orienta-nos a que os apresentemos a
Ele. Provérbios 16 nos mostra a melhor forma de lidar com nossos planos
pessoais para o futuro: “Do homem são as preparações do coração, mas do SENHOR,
a resposta da boca.
Todos os caminhos do
homem são limpos aos seus olhos, mas o SENHOR pesa os espíritos. Confia ao
SENHOR as tuas obras, e teus pensamentos serão estabelecidos” (Pv 16.1-3).
Esses versos nos ensinam basicamente 3 verdades: a) o homem pode preparar seus
planos, mas Deus é que dá a última palavra; b) nossos projetos podem estar
certos aos nossos olhos, mas ao mesmo tempo serem reprovados por Deus; c)
quando confiamos ao Senhor nossos planos, dependendo realmente da aprovação
dEle, podemos ter a certeza de que se esses planos forem aprovados por Ele,
eles serão realizados.
Deus não deseja estar
distante de nossos projetos pessoais. Ele quer participar de cada esfera de
nossa vida, mas quer que confiemos nEle mesmo que precisemos abrir mão de
nossos planos em prol dos dEle. Façamos projetos e invistamos neles dentro de
nossas possibilidades, mas nunca nos esqueçamos de que nossa vida é muito
breve, que não temos controle sobre ela, e que Deus tem sempre planos melhores
do que os nossos: “Porque eu bem sei os pensamentos que penso de vós, diz o
SENHOR; pensamentos de paz e não de mal, para vos dar o fim que esperais” (Jr
29.11).
E fácil render nossos
planos ao Senhor? Claro que não, principalmente quando não confiamos plenamente
nEle ou quando achamos que Ele vai frustrar os nossos planos. Mas à medida que
andamos com Ele, vamos crescendo na comunhão e confiança naquilo que Ele quer
para nós. Quando andamos com Deus e temos uma confiança contínua no que Ele
está fazendo ou vai fazer, não teremos dificuldades para confiar nossa vida
terrena àquEle que já tem um grande projeto eterno para todos nós.
Alexandre
Coelho e Silas Daniel. Fé e Obras, Ensinos de Tiago para uma Vida Cristã
Autêntica. Editora CPAD. pag. 128-132.
Tg 4.13 A palavra
“vós” provavelmente se refere aos homens de negócios. Endereçar esta carta a pessoas
dispersas supõe, pelo menos em parte, que as pessoas estabeleceram uma nova
vida em lugares distantes. Mas as suas lições se aplicam a qualquer situação
que exija planejamento. Planejar não é mau - na verdade, os homens de negócios
são aconselhados a planejar com antecedência. O problema a que Tiago se refere,
entretanto, é que Deus não está incluído nestes planos. Os comerciantes planejam
com arrogância, pensando que podem ir onde quiserem e que podem permanecer ali
por quanto tempo quiserem. A sua maneira de planejar, fazer negócios e usar o
dinheiro pode ser honesta, mas não é realmente diferente do planejamento de
qualquer homem de negócios pagão. Estes homens de negócios cristãos deveriam
fazer algo melhor.
Comentário do Novo
Testamento Aplicação Pessoal. Editora CPAD. Vol. 2. pag. 686.
Tg 4.13 «...Atendei,
agora...»,O grego diz, literalmente, «vinde agora», com a força de «vede
agora». Assim também se lê em Tia. 5:1. Isso representa um convite insistente,
uma chamada incisiva para que se dê atenção. Na Septuaginta temos tal expressão
nos trechos de Juí. 19:6; II Reis 4:24 e Isa. 43:6.
«...vás que
dizeis...» Em seus corações e em suas atitudes, e que às vezes se manifestava
abertamente em suas palavras. Tanto no íntimo como nas palavras proferidas,
Deus era deixado do lado de fora. Que se poderia aproveitar disso? Tais motivos são uma
forma de mundanismo, de amor às vantagens terrenas.
«...hoje ou amanhã...
» Tais pessoas
dizem: «O tempo está em nossas mãos», em contradição com o que ensinam as
Escrituras. E continuam: «Quer hoje, quer amanhã, a decisão depende de nossos
próprios desejos, de nossos caprichos, e não de Deus».
«...cidade tal...»
Literalmente, «...esta cidade...», alguma cidade específica em mente, que
oferece boas oportunidades de lucro. Ê possível, entretanto, que essa palavra
seja aqui usada como uma designação indefinida, e não porque aqueles que fazem
tais planos não sabem para onde vão; antes, porque o autor sagrado, ao criar
uma situação hipotética, não
tinha um lugar definido em mente. Alguns intérpretes preferem este último
sentido.
«...passaremos um
ano...» Um tempo regularmente longo, mas ainda sem levar Deus em consideração.
Seria um ano vivido inteiramente para o próprio «eu».
«...negociaremos e
teremos lucros...» O autor sagrado não condena o desejo de obter lucro ou de
alguém ocupar-se de atividades comerciais legitimas. Mas o que é condenado é a
atitude totalmente egoista de certas pessoas. Ele se sentia chocado que certos
homens podem fazer esses planos, deixando Deus inteiramente de fora. Eles
viajam buscando lucro, o que é uma prática comum, na antiguidade e nos dias
hodiernos. Mas fazem tudo sem Deus, até onde diz respeito a suas vontades.
«Não te incomodes com
o amanhã, pois não sabes o que o dia te trará. Talvez ele não esteja vivo ao
amanhecer, e assim ter-se-ia preocupado por um mundo que não mais existe para
ele». (Sanhedrin 100b, extraido do Talmude). Há grande semelhança entre essa
declaração talmúdica e o que declarou o Senhor Jesus (em Mat. 6:25 e ss.,
especialmente o versículo 34), em reverberação ao que ele dissera: «Buscai, em
primeiro lugar, o reino de Deus...» (versículo 33).
Pontos de vista
diversos sobre o uso da vida: O autor sagrado apresenta certo ponto de
vista—não devemos ter cuidados que não sejam postos sob o governo de Deus. Isso
representa uma inquirição espiritual que é deleitosa para a mente divina. Isso
também agrada a Jesus Cristo, que é nosso Senhor. (Ver as notas expositivas em
Rom. 1:4 quanto ao «senhorio de Cristo»). A resposta dos epicureus, entretanto,
era: «Vive para os prazeres». A resposta dos estóicos, era: «Vive com apatia,
indiferente a qualquer emoção». Aristóteles recomendava: «Vive para alguma
função virtuosa». Platão declarava: «Vive para o mundo eterno, para que passes
para as dimensões do espírito puro, quando fores liberto do corpo». O filósofo
chinês, Yang Chu, tomava o ponto de vista epicureu ou hedonista, ao dizer: «Cem
anos é o limite de uma longa vida. Nem uma pessoa, em cada mil, consegue chegar
a esse ponto. Contudo, se alguém atingi-lo, a infância inconsciente e a idade
avançada furtarão metade desse tempo. O tempo em que passará inconsciente,
enquanto dorme, à noite, e aquilo em que desperdiça os seus pensamentos,
durante o dia, também totaliza a outra metade do tempo restante. Além disso, as
dores e enfermidades... preenchem alguns anos, de modo que realmente ficará
apenas com dez anos, mais ou menos, para seu aprazimento... Portanto,
devemo-nos apressar a gozar a vida, sem dar atenção à morte... Permite que os
ouvidos ouçam o que lhes agrada, que os olhos vejam o que lhes agrada, que o
nariz sinta as fragrâncias que lhe parecerem agradáveis, e que a boca diga o
que melhor lhe parecer, e que o corpo desfrute dos confortos que puder, para
que faça o que melhor lhe parecer». (Yu-lan Eung, A Comparative Study ofLife
Ideals, págs. 82-84).
Talvez essa última
citação indique um bom raciocínio, especialmente se imaginarmos que não há
imortalidade, se as ações desta vida não têm efeito atinente à «vida futura».
Na realidade, porém, a vida é um «grande continuam». Passa através de vários
estágios, antes do nascimento, no nascimento, após o nascimento, na morte, após
a morte e por todo o tempo é a mesma pessoa que vive, pois a alma é imortal. A
morte não mata. E, por conseguinte, o indivíduo é responsável por aquilo que
pratica, pouco importando por quanto tempo ele viva na terra; pois o que importa
é a maneira de sua vida. A morte não nos leva a escapar da vida, e nem da
necessidade de prestarmos contas. Somos responsáveis por aquilo que fazemos, de
bom ou de mal (ver II Cor. 5:10). Nesse versículo mencionado, damos a nota de
sumário sobre o julgamento do crente. A vida física, na realidade, é bem
passageira; mas o que importa é quê estejamos vivendo de acordo com a dimensão
eterna; e a nossa inquirição espiritual deve visar aquela forma de imortalidade
que o próprio Deus possui. (Ver João 5:26,27 e 6:57, bem como as notas
expositivas ali existentes, sobre a vida «necessária» e «independente» de
Deus).
Avaliando A Vida E Os
Seus Valores
1. O ateu diz: «Há
boas evidências como o mal existente no mundo, seus desastres, violências,
ódio, etc., e que Deus não existe. Portanto, viverei essencialmente para mim
mesmo, e talvez, um pouco para mais uma ou duas pessoas».
2. O agnóstico diz:
«É impossível decidir se Deus existe ou não. Há evidências positivas e negativas
quanto a isso. Porém, como não posso saber (pelo menos por enquanto) qual a
verdade da questão, conduzirei a minha vida como um ateu prático. Agirei como
se Deus não existisse, até obter maiores luzes. Viverei essencialmente para mim
mesmo, e somente para o presente».
3. O positivista
lógico diz: «Não há qualquer evidência, nem a favor e nem contra a existência
de Deus, porquanto questões como essa estão completamente fora da possibilidade
de nossas investigações. O único tipo de conhecimento que possuímos é de ordem
científica; por conseguinte, viverei para a ciência e para as coisas que ela
pode oferecer. Viverei exclusivamente para este mundo. Não me preocuparei com
especulações metafísicas».
4. O hedonista diz:
«O alvo da vida é o prazer. Empregarei a minha inteligência e todos os recursos
físicos para fomentar a quantidade e á qualidade dos meus prazeres. Este mundo
e meu. Viverei para o mundo».
5. O teísta diz:
«Creio em Deus e em suas leis. Creio que sou responsável diante de Deus, porque
ele intervém na história humana e porque os homens lhe estão sujeitos.
Portanto, viverei para o mundo vindouro. Minha vida, neste mundo, será
governada pela dimensão eterna. Aquilo que o Senhor quiser, isso farei. O que
ele não quiser, não o farei».
CHAMPLIN, Russell
Norman, O Novo Testamento Interpretado
versículo por versículo. Editora Candeias. Vol. 6. pag. 69-70.
No v. 6 Tiago
escreveu: “Deus resiste aos soberbos, mas aos humildes concede graça.” Deus diz
“não” à vida daqueles que fazem de conta que Deus não existe e de que têm tudo
nas próprias mãos e em seu poder de deliberação. Ele publica seu “sim” sobre a
vida daqueles que sabem: Deus é Deus e nós somos seres humanos. Nesse contexto
Tiago passa a tratar de algo que tem particular atualidade entre nós ocidentais
laboriosos e ativos, principalmente hoje, a saber, o planejamento, a agenda de
compromissos.
1 – Planejar é
necessário (v. 13).
Tg 4.13 “Hoje ou
amanhã, viajaremos”: fala-se do planejamento. Hoje há planejamento em toda
parte: no governo federal, nos estados, nas igrejas, planos financeiros de
médio prazo, planos de desenvolvimento, planejamentos rurais e urbanos. Em
todos os lugares há tarefas que precisam ser planejadas em longo prazo. A
economia precisa planejar. Para permanecerem aptas na concorrência e preservar
postos de trabalho as empresas precisam planejar com grande antecedência o
desenvolvimento de seus artigos, bem como os preparativos da produção. Na
política educacional é preciso planejar, também para assegurar que todo o povo
seja apto para a concorrência no mundo. Existe uma ciência que se ocupa de
possíveis desenvolvimentos futuros, elaborando fundamentos e oferecendo
impulsos para o planejamento. Também na vida individual existem hoje
planejamentos em várias áreas: é preciso planejar a formação pessoal e sua
continuação, bem como a educação dos filhos. Precisamos antever o que será
necessário no futuro. Na construção da casa e no seu financiamento há
necessidade de planejar. Um pai de família responsável fará um plano para o
caso de não ser mais capaz de trabalhar ou mesmo falecer. Todos esses
planejamentos são necessários, sobretudo na atual sociedade industrial muito
diferenciada e complicada em nosso país densamente povoado. Para o cristão um
planejamento cuidadoso fará parte da fidelidade que se exige de um bom
administrador (cf. Lc 12.42; 1Co 4.2).
2 – Como nosso
planejar se torna errado?
a) Afinal, o que
Tiago está questionando (cf. v. 16)? Em que somos advertidos pela palavra de
Deus? Não o planejar em si, mas o espírito com que se planeja. Trata-se de um
planejamento em que o ser humano não pensa mais em si: “Nas tuas mãos estão os
meus dias” (Sl 31.15). Ele se refere a um planejar em que o ser humano presume
que tenha o controle de todos os fatores, em que realiza tudo segundo sua
vontade, com meios próprios e com força pessoal, no qual em última análise age
como se ele mesmo fosse Deus. Por meio de Tiago, a palavra de Deus também quer
fechar essa porta para o gênio falso do inimigo que, embora sendo criatura,
pretende ser deus ao lado de Deus, deus contra Deus, e até mesmo deus acima de
Deus, infectando os seres humanos com seu mau espírito: “Sereis como Deus” (Gn
3.5). Essa hýbris, essa mania de grandeza do ser humano perpassa a história do
mundo, até o anticristo (2Ts 2.3-12; Ap 13), o “cristo do diabo” que
corporifica esse espírito de forma pura.
b) Nós humanos
modernos corremos singularmente o perigo de dar espaço a esse espírito, porque
somos obrigados a planejar e sobretudo porque temos possibilidades tão
grandiosas para planejar. – A geração que construiu a torre (Gn 11) é um modelo
exato da sociedade humana atual: haviam feito invenções e descobertas
importantes - sabiam produzir pedras artificiais, tijolos; descobriram uma
argamassa muito durável, resina da terra, asfalto. Encontraram um excelente
terreno para construir, a planície de Sinar. As invenções e descobertas em si
não eram erradas. Faziam parte do cumprimento da tarefa: “Sujeitai a terra” (Gn
1.28). Errada, porém, era a postura interior. Pretendem teimar contra a vontade
de Deus e permanecer unidos contra a orientação dele. Como símbolo dessa coesão
planejaram uma gigantesca torre, sobre a qual pensavam estar entronados na
mesma altura de Deus (a mania humana de grandeza é sempre simultaneamente
tolice). Pretendiam “tornar célebre seu nome” (Gn 11.4), ao invés de exaltar o
nome de Deus (Sl 34.3) e esperar até que Deus lhes tornasse célebre o nome (Gn
12.2). Queriam construir sozinhos “sua eternidade”, um memorial “para todos os
tempos”.
c) Precisamente esse
é o espírito que Tiago combate em toda a carta e diante do qual ele previne
como um impactante pregador da penitência. É o espírito que representa tão alto
risco para nós hoje e que é motivo especial para os juízos de Deus no curso e
no alvo da história. Especialmente onde cristãos atuam em posições de
responsabilidade no Estado, na economia e pesquisa, esse ponto de incursão do
espírito satânico aqui descrito representa para eles um ponto particularmente
perigoso. Somos remetidos à oração em vista do risco para nós mesmos e de
nossos irmãos que ocupam essas posições.
d) Corremos esse
perigo também quando nós cristãos agimos em prol do reino de Deus: em obras de
diaconia, em ações de socorro a outros grupos étnicos, em cruzadas
missionárias. As pessoas capazes e ativas correm o risco de acabar atuando
exclusivamente segundo planos pessoais, confiando na própria força, com recursos
próprios e para sua própria honra. Porém tudo isso fará parte de “palha, feno,
restolhos”, que conforme 1Co 3.12-15 serão queimados um dia. – Vemos também na
Escritura exemplos de pessoas (até mesmo bem-intencionadas) que atuaram dessa
maneira e que fracassaram: quando Moisés tentou realizar algo por seu povo
segundo seu próprio parecer, seus próprios planos, com força própria, com meios
próprios e em época pessoalmente definida, tudo redundou em grave fracasso (Êx
2.11-15). Frequentemente a dificuldade está em distinguir entre o plano de Deus
e a escolha pessoal (cf. a esse respeito o excurso no final do comentário sobre
o presente bloco: “Como percebemos a condução de Deus em nossa vida?”). –
Passemos agora à exegese detalhada:
3 – O ser humano não
tem motivo para estar seguro de si (v. 13s).
13 “Vamos agora”:
percebemos o ser humano pró-ativo e resoluto, que arrasta consigo também outras
pessoas. É a esse modo de falar que Tiago alude.
“Hoje ou amanhã”: a
expressão se refere à rapidez com que ele faz os planos e os leva à execução. –
“Nessa e naquela cidade”: o homem pondera onde o mercado está mais favorável
naquele exato instante.
14 “Um ano”: hoje
elaboramos planos quadrienais ou quinquenais, na presunção de que podemos
dispor com segurança de um futuro distante. Contudo não somos donos do futuro.
É Deus quem dispõe sobre ele. “Afinal não sabeis como será vossa vida amanhã.”
Muitas coisas podem atingir o ser humano, frustrando seus planos: enfermidades
e desastres, mudança na conjuntura política e econômica etc. Merecem destaque
dois aspectos: a questão da duração de nossa vida e a das rápidas mudanças na
realidade em que vivemos.
a) A duração breve e
incerta de nossa vida é motivo para não termos tanta segurança: “Porque sois
apenas como neblina que aparece por instante e logo se dissipa.” A vida humana
é como o vapor da caldeira de água fervente ou como o hálito da boca no frescor
da manhã, como a bandeira de fumaça de uma locomotiva a vapor ou a coluna
expelida por uma válvula, como a “escrita no céu” que um avião desenha contra o
azul celeste para fins de propaganda: permanece por pouco tempo, depois se
modifica, e em pouco tempo já não se vê mais nada (cf. Sl 90.5s; Is 40.6s; Lc
12.20).
b) Outro motivo dessa
insegurança é hoje, entre outros, o fato de que o desenvolvimento acelerado em
todas as áreas não pode ser plenamente previsto por ninguém. Nenhuma pessoa
sabe com certeza como tudo se concretizará e quais exatamente serão seus
efeitos na ação conjunta. No passado o ser humano estava ameaçado pela
natureza, hoje é a natureza que está sendo ameaçada pelo ser humano. Pessoas
que atuam na linha de frente, se forem responsáveis, com frequência são tomadas
de apreensão.
Fritz
Grunzweig. Comentário Esperança Carta De
Tiago. Editora Evangélica Esperança.
2. A incerteza e a
brevidade da vida (Tg 4.14).
Tg 4.14 Há um
problema com estes planos tão bem elaborados - ninguém pode saber o que acontecerá
amanhã, para não dizer dentro de um ano (veja Pv 27.1; Lc 12.16-21). Estas
pessoas estavam fazendo planos como se o seu futuro estivesse garantido. Tiago
não está sugerindo que eles não façam planos por causa de um possível desastre,
mas que sejam realistas sobre o futuro, confiando em Deus para orientá-los.
Como o futuro é incerto, é ainda mais importante que nós dependamos
completamente de Deus. A nossa vida é incerta, como uma neblina que cobre o campo
pela manhã e depois é dissipada pelo sol. A vida é curta, não importando quanto
tempo vivamos. Não devemos nos enganar pensando que temos tempo de sobra para
viver para Cristo, para desfrutar nossos entes queridos, ou para fazermos aquilo
que sabemos que devemos fazer. Hoje é o dia de viver para Deus! Então, não
importando quando a nossa vida termine, teremos cumprido os planos que Deus tem
para nós.
Comentário do Novo
Testamento Aplicação Pessoal. Editora CPAD. Vol. 2. pag. 686.
Tg 4.14 «...o que
sucederá amanhã...» Há uma história, contada pelos rabinos. que ilustra a
questão: «Os nossos rabinos contam-nos uma história que aconteceu nos dias do
rabino Simeão, filho de Quelpata. Ele estava presente à circuncisão de uma
criança, e ficou com o pai da mesma, na celebração que se seguiu. O pai trouxe
vinho de sete anos de idade para seus convidados, dizendo: Com este vinho
continuarei a celebrar por longo tempo o nascimento de meu filho recém-nascido.
Eles continuaram a ceia até à meia-noite. Então o rabino Simeão se despediu
para retomar à cidade onde morava. No caminho de volta, viu o anjo da morte,
que andava para lá e para cá. E ele lhe perguntou: ‘Quem és tu?’ E ele
respondeu: ‘Tiro a vida daqueles
que dizem, Faremos isto ou aquilo, e não pensam de quão breve a morte se apossa
deles. Aquele homem, com quem tomaste a ceia, e que disse a seus convidados:
Com este vinho continuarei celebrando por muito tempo o nascimento de meu filho
recém-nascido, eis que o fim de sua vida se aproxima, porquanto ele morrerá
dentro de trinta dias’». (Debarim Rabba, secção 9, foi. 261:1). Que história
impressionante! Quem disse que o Talmude é sensaborão?
«Que a incerteza da
vida nos relembre de quanto dependemos de Deus». (Ropes, in loc.).
«...neblina...» No
grego temos o termo «atmis», «vapor» ou «fumo», segundo também se vê em Esd.
7:61 e Apocalipse de Baruque 82:6, sendo palavra usada para indicar a natureza
fugidia e tênue desta vida mortal. O termo grego pode significar uma ou outra
dessas coisas. Indicava o «vapor» que escapa da água fervente, ou indicava a
«fumaça» produzida pela combustão de algo. Parece não haver qualquer apoio
léxico para a tradução «neblina», que ordinariamente era «amichle» ou «aer», no
original grego.
Porém, a alusão pode
ser à «neblina» que se levanta de um rio ou lago, cedo pela manhã, e que logo
se dissipa, assim que aparece o sol.
A mentalidade da
segurança e do planejamento carnais se esboroa ante o fato brutal da
mortalidade e da fragilidade do homem. Pouco tempo depois dessas palavras de
Tiago terem sido escritas, o desastre e a morte caíram sobre Jerusalém com
tremenda força. Ê bem possível que alguns dos leitores originais desta epistola
tenham morrido debaixo do açoite de Roma.
CHAMPLIN, Russell
Norman, O Novo Testamento Interpretado
versículo por versículo. Editora Candeias. Vol. 6. pag. 70-71.
Tg 4:14 / Em
contraste com o caráter racional e seguro de seus planos, sobressai a
insegurança desta vida: Ora, não sabeis o que acontecerá amanhã. De fato, a vida
é eminentemente efêmera: O que é a vossa vida? É um vapor que aparece por um
pouco, e logo se desvanece. Os planos estão traçados; as projeções lançadas. Todavia,
tudo gira em torno de uma vontade superior à deles, a de Deus, que não foi
sequer consultado no planejamento. Naquela noite mesmo uma doença pode derrubar
alguém; de súbito, seus planos se evaporam. Os planos deles se resumirão numa
pequena viagem até a sepultura fria, no interior de um esquife. Esses homens
assemelham-se ao rico louco da parábola de Jesus, o qual ganhara grandes
margens de lucro honesto mediante investimentos agrícolas em sua fazenda. Sentindo-se
seguro, o ricaço traça planos para uma aposentadoria confortável “Mas Deus lhe
disse: Louco, esta noite te pedirão a tua alma” (Lucas 12:16-21). Ao pensar
unicamente numa esfera mundana, os negociantes crentes da carta de Tiago tinham
uma falsa sensação de segurança. Era preciso que encarassem a morte, e
percebessem que não tinham nenhum controle desta vida.
Peter
H. Davids. Comentário Bíblico
Contemporâneo. Editora Vida. pag. 146.
Tg 4.14. Ao fazerem
seus planos concernentes apenas a este mundo, estes homens de negócios deixaram
de reconhecer um fato fundamental — a natureza insubstancial e transitória
“deste mundo”. Para pessoas como elas (uma paráfrase do relativo indefinido
hoitines), planejar com tanta confiança é o cúmulo da tolice. Isto, o ponto
principal do versículo 14, está claro, embora seja debatida a forma exata em
que Tiago o expressa. A ARA (junto com ARC) divide em duas partes a primeira
divisão do versículo: uma declaração, Vós não sabeis o que sucederá amanhã, e
uma pergunta, Que é a vossa vida? Outras versões combinam estas duas partes
numa única declaração: “... não sabeis nem mesmo o que será da vossa vida
amanhã!” (BJ; cf. também a BLH e a pontuação dos textos gregos de Nestle-Aland
[26- edição] e das Sociedades Bíblicas Unidas [3ã edição]). A situação se
complica pela presença de muitas leituras variantes. Sem enumerar todos os
argumentos, a consideração decisiva parece estar na colocação de poios (o
que), que é mais estranho se analisado como o objeto de epistasthe (sabeis). Há
mais naturalidade em considerá-lo como uma introdução a uma pergunta separada,
segundo a tradução da ARA.
Assim, a resposta a
esta pergunta é dada na última parte do versículo, onde a vida é comparada a
uma neblina (atmis). Esta palavra também pode ser traduzida por “vapor” (BLH;
BJ; ARC; cf. At 2.19) e tem alguma afinidade com as “vaidades” da vida, das
quais tanto fala Eclesiastes. Qualquer que seja o sentido exato, Tiago, é
óbvio, pretende enfatizar a duração extremamente curta da vida. Uma
enfermidade, morte acidental ou a volta de Cristo poderiam abreviar nossa vida,
assim como o sol da manhã dissipa a neblina ou como uma mudança no rumo do
vento afasta a fumaça. Este reconhecimento realista da brevidade e incerteza da
vida e mesmo as figuras usadas para descrevê-la são encontrados com freqüência
nas Escrituras. Provérbios 27.1 adverte: “Não te glories do dia de amanhã,
porque não sabes o que trará à luz”. Jó 7.7, 9,16 e SI 39.5-6 descrevem a vida
como um “sopro”. Segundo costuma ocorrer, algumas palavras de Jesus aproximam-se
particularmente do ensino de Tiago. Em Lc 12.15, ele adverte as multidões
contra a avareza e as lembra de que “a vida de um homem não consiste na
abundância dos bens que ele possui”. Numa rápida parábola, ele ilustra o
argumento usando a figura de um homem rico que, à semelhança do negociante de
Tiago, fez planos definidos para aquisição de mais bens, mas foi impedido de
executá-los por sua morte (Lc 12.16-20). Esta passagem contém vários temas que
Tiago utiliza aqui e em 5.1-6, e é bem possível que lhe tenha dado o estímulo
para suas próprias exortações.
Douglas J. Moo. Tiago. Introdução
e Comentário. Editora
Vida Nova. pag.154-155.
3. O modo bíblico de
abordar o futuro (Tg 4.15).
Tg 4.15 Os crentes
não podem viver de uma forma independente de Deus; portanto, os nossos planos
não podem ignorá-lo. Precisamos ter a certeza de que estes planos incluem a
frase: Se o Senhor quiser. Devemos fazer planos, mas devemos reconhecer a
vontade superior de Deus e a soberania divina. Isto significa mais do que simplesmente
dizer: “Se Deus quiser”, quando falarmos a respeito dos planos futuros, porque
isto também pode perder o significado. Isto significa planejar com Deus ao
fazermos os nossos planos.
Os nossos planos devem
ser avaliados pelos padrões e objetivos de Deus, e nós devemos orar por eles
quando estivermos ouvindo o conselho de Deus. Esta forma de planejar agrada a
Deus.
Comentário do Novo
Testamento Aplicação Pessoal. Editora CPAD. Vol. 2. pag. 686.
Tg 4.15 Não faz
muito, quando pessoas piedosas escreviam cartas, acrescentavam «D.V.» a
quaisquer planos ali mencionados. Isso significa «Deo volente», isto é, se Deus
quiser. Seguiam literalmente—e esperamos que também seguiam no espírito—a
exigência do presente texto. O «D.V.» deveria ser escrito na alma, servindo-nos
de guia na vida, porquanto certamente Deus sabe melhor o que convém para nós.
«Pois o segredo do
ser do homem não consiste apenas em viver; mas em ter algo pelo que viver. Sem fim
conceito estável do objetivo da vida, o homem não deveria consentir em
continuar vivendo, preferindo destruir-se do que permanecer na face da terra,
embora tenha pão em abundância». (Dostoievski, Os Irmãos Karamazov, ao comentar
sobre a afirmativa do Senhor Jesus, «O homem não vive de pão apenas»).
O indivíduo
seriamente interessado em fazer a vontade de Deus, em lançar a sua alma nessa
direção, não demora a perceber quão inadequado é o ponto de vista dos
materialistas, sobre a vida' e sobre os ideais da vida. Em liossos próprios
dias, a ciência se tem tomado o novo deus, porque serve tão bem à prosperidade
material do homem. Mas é verdade o que disse Charles P. Steinmetz (um gênio
científico): «Algum dia, as pessoas aprenderão que as coisas físicas não trazem
felicidade, sendo de pouco uso para tornar homens e mulheres criativos e
poderosos. Então os cientistas do mundo transformarão seus laboratórios,
adaptando-os para o estudo de Deus, da oração e das forças espirituais».
A expressão «...Se o
Senhor quiser...» Não era comumente usada pelos judeus quando expressavam seus
planos e intuitos; mas era algo extremamente comum na cultura pagâ. Nos
escritos de Platão tal expressão é comum: Alei. i. pár. 135D; Hipp. major.,
par. 286C; Leges, par. 688E e 799E; Theat., par. 151D; e ver também Arist. Plut. 1188; Zeno., Hip ar.
9,8; Alex. Sever. 45; Minucius Felix, Oct. 18; Ennius ap. Cic. de off.
i. 12,38; Plautus, Capt. ii.3,94. Essa expressão também era de uso comum nos
escritos árabes. Seus autores, evidentemente, copiavam os sírios, e os sírios
copiavamos gregos, nesse costume sadio.
Parece, pois, que
Tiago recomendava aos judeus uma prática helenista, e que ele considerava digna
de ser adotada, pois não há qualquer evidência de que os judeus estavam
acostumados a falar assim. «Faz a vontade dele (de Deus) como se fosse a tua
própria vontade, para que ele faça a tua vontade, como se fosse a tua. Anula a
tua vontade diante da vontade dele, para que ele anule a vontade de outros
perante a tua vontade». (Pirke Gamaliel, palavras do rabino Gamaliel).
«Com o termo vontade
ele indica não aquilo que é expresso na lei, mas o conselho de Deus, mediante o
qual ele governa todas as coisas». (Calvino, in loc.).
Guia, luz bondosa, em
meio à melancolia circundante,
Guia-me Tu, para
adiante:
A noite é escura, e
estou longe de meu lar;
Guia-me Tu, para
adiante.
Guarda os meus pés;
não peço para ver a cena distante Pois um passo só me basta.
(John H. Newman)
(Quanto á vontade
toda-inclusiva de Deus, ver Efé. 1:10, sob o titulo «o mistério de sua
vontade», a saber, a restauração de todas as coisas em Cristo. Ver também
acerca da vontade de Deus, no tocante à «vida diária», comentado em Efé. 5:17 e
6:6). Deus opera em nós tanto o querer como o fazer, segundo o seu beneplácito
(ver FU. 2:13). Cumpre-nos ser «cheios do conhecimento de sua vontade» (ver
Col. 1:9). É da vontade de Deus que sejamos santificados (ver I Tes. 4:3). Ê de
sua vontade que todos os homens cheguem ao conhecimento da verdade e da
salvação (ver ITim. 2:4).
CHAMPLIN, Russell
Norman, O Novo Testamento Interpretado
versículo por versículo. Editora Candeias. Vol. 6. pag. 71.
A atitude correta (v.
15).
15 “Em vez disso,
deveis dizer: Se o Senhor quiser e nós vivermos, faremos isso ou aquilo” (cf.
também At 18.21; 1Co 4.19; 16,17; Hb 6.3): hoje essa palavra parece ser para
muitos uma sabedoria prosaica, um linguajar piegas e surrado (e eventualmente
também foi transformada nisso). Contudo essa palavra descreve precisamente a
atitude correta de um cristão. Desse modo somos colocados no lugar correto: “Se
o Senhor quiser… faremos” – então também acontecerá. A atitude correta de um
cristão nesse aspecto foi descrita com singular clareza por N. L. von
Zinzendorf [1700-1760], seguramente por experiência de vida pessoal, em seu
hino: “Grava, ó alma, essa grande palavra: quando Jesus acenar, então vá…” “Se
o Senhor quiser… faremos”: isso foi vivido por Jesus. Foi assim que Tiago, seu
irmão, presumível autor da presente carta, o conheceu. Seus irmãos esperavam que
ele se apresentasse no grande palco da festa em Jerusalém. Contudo ele se
recusou. Mais tarde, porém, foi para lá (Jo 7.8,10). Aguardou o sinal de seu
Pai. Foi assim que procedeu nas bodas de Caná (Jo 2.4,12) – possivelmente Tiago
também esteve lá – e da mesma maneira em vista da enfermidade e morte de seu
amigo Lázaro (Jo 11.6ss). Jesus diz: “O Filho do homem terá de padecer muitas
coisas” (Mt 16.21; 17.22; 20.17-19; 26.2). “Hoje tenho de entrar em tua casa”
(Lc 19.5). Nesse “tenho de”, em grego dei, igualmente se explicita a vontade, o
plano e o aceno do Pai. Por fim, Jesus ora: “Que se faça não a minha, mas a tua
vontade” (Lc 22.42). – Também Israel deixou que Deus lhe mostrasse o caminho
por meio da coluna de nuvem e fogo (Êx 13.21s), assim como Paulo aguardava a
sinalização de seu Senhor (At 16.6-10). A igreja de Jesus, e a igreja do fim
dos tempos, “segue ao Cordeiro para onde for” (Ap 14.4). O espírito de baixo,
porém, instiga a sair arbitrariamente dos trilhos do discipulado (cf. o exposto
em Tg 4.4 sobre a “meretriz da Babilônia” em Ap 17). – “À tua disposição, meu
Deus e meu Senhor, à tua disposição cada vez mais. À tua disposição na alegria
e dor; todo dia e toda hora pronto para Jesus” (F. Traub, missionário falecido
precocemente na China).
Fritz
Grunzweig. Comentário Esperança Carta De
Tiago. Editora Evangélica Esperança.
III - OS PECADOS DA ARROGÂNCIA E DA AUTOSSUFICIÊNCIA DO SER
HUMANO (Tg 4.16,17)
1. Gloriar-se nas
presunções (Tg 4.16a).
Ainda vinculado ao
assunto anterior, em que Tiago abordou o perigo de se fazer planos sem que Deus
participe deles, passamos agora a tratar da arrogância atrelada à
autossuficiência. No tópico anterior, parece que estamos contemplando crentes
esquecidos, e que no tópico atual, há crentes que se omitem em fazer o que é
certo. Um se esquece de Deus quando não o inclui em seus planos, e outro se
esquece de Deus quando conscientemente deixa de fazer o que é certo. A omissão
de quem sabe fazer o certo e não o faz é tida como um pecado. E uma lição bem
prática, bem ao estilo do irmão do Senhor.
A arrogância, ao que
parece, no texto de Tiago, está vinculada às pessoas que queriam viajar e fazer
negócios sem que Deus fosse consultado ou participasse de suas vidas. Isso pode
demonstrar também que essas pessoas acreditavam que Deus estava restrito à
esfera espiritual de suas vidas, e não à esfera material também. Essa forma de
ver a vida cristã é errada, pois somos cristãos dentro e fora da igreja. Nosso
cristianismo deve ser demonstrado não só no santuário, mas igualmente fora
dele. Na verdade, Deus espera que possamos dar testemunho de nossa fé com
nossas atitudes fora do âmbito da comunidade cristã. E a reprimenda de Tiago
nos mostra que aqueles crentes estavam agindo de forma errada.
Esse é um dos erros
mais comuns dos cristãos de nossos dias. Não raro, há crentes que imaginam que
podem ser uma pessoa na igreja e outra fora dela. Há pessoas crendo que é
possível adorar a Deus no domingo e quando chega a segunda- feira, agir de
acordo com as regras deste mundo, como se não tivéssemos um Deus. Um
comerciante cristão pode acreditar que não há qualquer problema em repassar a
um consumidor uma mercadoria reconhecidamente defeituosa. Um estudante cristão
pode acreditar que não há problemas em se utilizar de meios ilícitos para se
obter uma boa nota numa avaliação. Um funcionário cristão pode crer que não há
problema algum em se apropriar de um objeto da empresa em que trabalha,
imaginando que não vai fazer falta lá. Mas se Deus os pesar em uma balança, com
certeza será achado em falta.
Não existe dualidade
na vida cristã. Preciso ser fiel a Deus tanto na igreja quanto fora dela, ou
provavelmente esvaziarei meu testemunho diante dos ímpios. Quantos de nós já
não ouvimos críticas sobre pessoas da igreja que nem mesmo parecem servir a
Deus? Mas também já ouvimos opiniões de pessoas que não conhecem Jesus, mas que
tem contato com homens e mulheres cujos testemunhos irradiam uma comunhão
imensa com nosso Senhor, por meio de sua vida e atitudes.
Tiago conclui seu
pensamento no verso 17 informando que quem sabe fazer o bem e não faz, comete
pecado. Para Tiago, a comissão é fruto direto da omissão em relação ao pecado.
Esta não se realiza apenas quando agimos de forma errada, mas também quando
deixamos de agir de acordo com o padrão que Deus espera de nós. Jesus certa vez
disse: “E o servo que soube a vontade de seu senhor e não se aprontou, nem fez
conforme a sua vontade, será castigado com muitos açoites” (Lc 12.47). Esta
parábola de Jesus fala sobre serviço e obediência, e Jesus utiliza a figura de
um servo que teve à sua disposição os bens de seu senhor. Nessa história, o
mordomo inicialmente é um homem fiel e prudente, que apesar da ausência de seu
amo, faz aquilo que é certo. Mas Jesus apresenta a possibilidade de esse mesmo
servo aproveitar a ausência de seu senhor para maltratar seus conservos, e
aproveitar-se dos mantimentos que deveriam ser distribuídos a todos. Esse tipo
de servo será duramente punido por sua atitude de covardia e de desperdícios.
Se atentarmos bem
para essa história, podemos nos ver sendo enquadrados em qualquer uma das duas
categorias desse mesmo servo. Podemos ser fiéis e prudentes, obedecendo a Deus
e respeitando nossos conservos, como podemos também nos aproveitar dos
bens “depositados” em nossa conta e esquecer-nos de que um dia prestaremos
contas ao Senhor pela forma com que usamos tais bens. Um mesmo servo, duas
possibilidades de atitudes, com duas consequências distintas. Na prática, Deus
já nos deu o que precisamos para viver, e até mais do que o necessário, a fim
de partilharmos com outros.
A mensagem final: Não
sejamos arrogantes nem imaginemos que somos autossuficientes a ponto de não
precisar depender de Deus. E que os recursos que recebemos de Deus nos lembrem
de que um dia prestaremos contas a Deus de nossa mordomia.
Alexandre
Coelho e Silas Daniel. Fé e Obras, Ensinos de Tiago para uma Vida Cristã
Autêntica. Editora CPAD. pag. 131-134.
Tg 4.16ª Da
Negligência à Oposição
Quão longe um homem
pode ir em sua negligência a Deus sem passar o ponto de estar em oposição
direta? E acerca disso que Tiago trata aqui. Até aqui parece que Tiago tem
censurado a negligência e o descuido em vez do pecado consciente. Notamos uma
mudança de tom, e ele ressalta o perigo da auto-suficiência. Mas, agora (v. 16,
nun de) significa: vocês precisam incluir Deus em seus planos, mas os fatos
mostram que vocês não o estão fazendo — e vocês estão, de certa forma, tendo um
certo prazer na sua auto- suficiência. Phillips interpreta o significado desse
versículo claramente: “Em vez disso, vocês estão mostrando um certo orgulho em
planejar o seu futuro com tanta confiança.
A.
F. Harper. Comentário Bíblico Beacon.
Tiago. Editora CPAD. Vol. 10. pag. 187.
Tg 4.16ª Somos
dirigidos a evitar a vanglória, e a considerá-la não somente algo tolo, mas
como uma coisa muita maligna. “Mas, agora, vos gloriais em vossas presunções;
toda glória tal como esta é maligna” (v.16). Eles tinham esperanças de vida e
prosperidade, e de grandes coisas no mundo, sem a devida consideração por Deus;
e aí se vangloriavam dessas coisas. Essa é a alegria das pessoas mundanas, se
vangloriarem de todos os seus sucessos, e mais, às vezes até se vangloriarem dos
seus projetos antes de saber que sucesso obterão. Como é comum que os homens se
vangloriem de coisas que não possuem, a não ser do que brota da sua própria vaidade
e presunção! Toda glória tal como esta, diz o apóstolo, é maligna; é tola e é
nociva.
HENRY.
Matthew. Comentário Matthew Henry Novo Testamento
ATOS A APOCALIPSE Edição completa. Editora CPAD. pag. 846.
Tg 4:16ª Entretanto,
aqueles crentes estavam longe de planejar em espírito de oração, pois dizem:
Vós vos jactais das vossas presunções. Ora, toda jactância tal como esta é
maligna. A palavra-chave aqui é jactância, visto que indica uma atitude
interna. O orgulho é a vindicação de quem se jacta em vão, de quem vindica uma
habilidade que na verdade não possui. Trata-se de vindicação de controle e de
posição na vida mencionada em 1 João 2:16, mas tal vindicação é falsa, porque o
mundo em cujo contexto a jactância é proferida está desaparecendo.
Temos aí as
vindicações presunçosas e o comportamento cheio de ostentação pelos quais os
homens procuram impressionar-se uns aos outros e, com frequência, acabam
iludindo-se uns aos outros”
Peter
H. Davids. Comentário Bíblico
Contemporâneo. Editora Vida. pag. 147.
2. A malignidade do
orgulho das presunções (Tg 4.16b).
Tg 4.16b Quando os
homens se vangloriam de coisas mundanas e de seus projetos ambiciosos, quando
na verdade deveriam observar os humildes deveres expostos anteriormente (w.
8-10), isso é uma coisa muito maligna. E um grande pecado aos olhos de Deus,
vai conduzi-los a grandes frustrações, e vai comprovar a sua destruição no
final. Se nos alegramos em Deus porque nosso tempo está em suas mãos, que todos
os eventos estão à sua disposição e que Ele é o nosso Deus do concerto, essa
alegria é boa; a sabedoria, o poder e a providência de Deus estão então
ocupados em fazer com que todas as coisas cooperem para o nosso bem. Mas, se
nos alegramos na nossa própria confiança e nas nossas vanglorias presunçosas,
isso é maligno. E um mal que precisa ser cautelosamente evitado por todos os
homens sábios e bons.
HENRY.
Matthew. Comentário Matthew Henry Novo Testamento
ATOS A APOCALIPSE Edição completa. Editora CPAD. pag. 846.
Tg 4.16b «...maligna...»
No grego é «poneros», que significa «errado», «prejudicial», por ser mal.
(Comparar isso com Tia. 2:4; Mat. 5:19; João 3:19; 7:7; I João 3:12; Col. 1:21
e Atos 25:18).
O presente versículo
fala especificamente sobre o «orgulho da vida» (ver I João 2:16). Trata-se da
confiança equivocada dos ímpios, em sua habilidade de levarem uma vida baseada
na arrogância, sem sofrerem perturbação ou perda. Trata-se do indivíduo que
pensa que não precisa da providência divina em sua vida. Ele é o seu próprio
bem; ele adora a si mesmo.
CHAMPLIN, Russell
Norman, O Novo Testamento Interpretado
versículo por versículo. Editora Candeias. Vol. 6. pag. 71.
Vós vos jactais em
vossos planos de grandeza oca: “Você devia ver o negócio que estou prestes a fechar”,
ou talvez umas palavras que ressoam mais modestas: “Pois é, amanhã irei a Roma.
Meu agente estabeleceu uma loja finíssima perto do fórum. Já se diz que é a
loja mais sofisticada da região”. E assim prossegue a jactância: menção de nomes
de pessoas importantes, alusões a lugares e a pessoas de grande poder, vaidosa
descrição de negócios que serão realizados, mas tudo isso resumindo-se em
jactância vazia. porque só Deus controla nossas vidas. Tiago declina essa
atitude de modo severo: é maligna, porque rouba de Deus o direito honroso que
lhe cabe como Senhor soberano, e exalta o mero homem,
Peter
H. Davids. Comentário Bíblico
Contemporâneo. Editora Vida. pag. 147.
3. Faça o bem (v.17).
Tg 4.17 Este
versículo resume todo o conteúdo dos capítulos I a 4 e todo o problema ético
contido em toda a carta de Tiago. Ele pode estar dizendo aos comerciantes que
eles sabem o que devem fazer — isto é, honrar a Deus nas suas práticas comerciais. Se
ignorarem isto, estarão pecando.
Em um sentido mais
amplo, Tiago acrescenta estas palavras como uma admoestação para que todos os
seus leitores façam o que ele escreveu: Aquele, pois, que sabe fazer o bem e o
não faz comete pecado. Eles foram avisados, de modo que não têm desculpa.
Nós temos a tendência
de limitar os pecados a atos específicos - fazer algo errado. Mas Tiago nos diz
que não fazer o que é certo também é pecado. (Estes dois tipos de pecado são,
às vezes, chamados pecados de comissão e pecados de omissão.) Mentir é um
pecado; conhecer a verdade e não dizê-la também pode ser um pecado. Falar mal
de alguém é um pecado; evitar esta pessoa quando você sabe que ela precisa da
sua amizade também é um pecado. Nós devemos estar dispostos a ajudar os outros
conforme o Espírito Santo nos orientar. Se Deus ordenou que você realize uma
boa ação, preste algum serviço a outras pessoas, ou restaure um relacionamento
— faça isto. Você sentirá uma vitalidade renovada e revigorada na sua fé cristã.
Comentário do Novo
Testamento Aplicação Pessoal. Editora CPAD. Vol. 2. pag. 686-687.
Pecados de Omissão
(4.17)
O versículo 17 pode
ser entendido como uma exortação conclusiva do tema apresentado nos versículos
13-16. “Aqueles a quem as palavras foram dirigidas tinham, até certo ponto,
falhado por meio da negligência; agora que essas coisas foram apresentadas de
forma bastante clara, eles estão na posição de saber como agir; se, apesar de
saberem agora como agir de forma correta, negligenciarem o curso apropriado,
então isso é pecaminoso”.16 Mas essa verdade também é ressaltada em outras
partes da Bíblia. Palavras semelhantes são apresentadas por Jesus: “E o servo
que soube a vontade do seu senhor e não se aprontou, nem fez conforme a sua
vontade, será castigado com muitos açoites” (Lc 12.47). Em um sentido real, o
versículo 17 pode ser aplicado a diversos aspectos até aqui na epístola (cf.
1.22; 2.14; 3.1,13 e 4.11). Phillips apresenta uma excelente paráfrase desse
versículo: “Sem dúvida, vocês concordam com a teoria acima. Bem, lembrem-se que
se um homem sabe o que é certo e não o faz, essa omissão é considerada pecado
real”.
A.
F. Harper. Comentário Bíblico Beacon.
Tiago. Editora CPAD. Vol. 10. pag. 187.
Tg 4.17 A recusa da
obediência: “Portanto, aquele que sabe que deve fazer o bem e não o faz, é para
ele pecado”: nesse contexto, portanto, ocorre a conhecida palavra do v. 17. Sem
dúvida podemos lhe atribuir também um significado geral, de que comete pecado
aquele que sabe o que seria bom em sua situação, mas não obstante deixa de
realizá-lo. Contudo, de acordo com o contexto a palavra se refere à questão
específica de que devemos estar prontos e dispostos para o plano, a vontade e a
sinalização de Deus. De modo geral e no caso concreto é “bom” aquilo que Deus
quer (“bom” não é o que a moral humana define como tal). – Além disso, faz
parte de nos tornarmos obedientes à vontade, ao plano e à sinalização de Deus
que não nos deixemos monopolizar e prender tanto pelos nossos próprios
planejamentos, inclusive no tocante à jornada diária, que não estejamos mais
abertos e livres para as incumbências para as quais Deus nos chama a cada
instante. É correto distribuir com cuidado o tempo, mas é importante estar
também disposto a se sujeitar a qualquer momento aos planos de Deus e a receber
novas incumbências. É necessário que sejamos flexíveis para Deus. Talvez o
sacerdote em Lc 10.31 não tenha chegado a ajudar o pobre porque seu tempo já
estava preenchido com seu planejamento. Em todos os casos é essa a situação de
um grande número de “sacerdotes” que hoje passa ao largo de um ser humano que
Deus deita diante dele. Em contraposição, com que disposição Filipe e Pedro se
deixaram chamar por seu Senhor, para fora de seus esquemas e em direção de
outras tarefas, inclusive quando diziam respeito a apenas poucas pessoas (At
8.26s; 10.20)!
EXCURSO: no presente
contexto pode emergir para muitos a pergunta: “Como percebemos a condução de
Deus em nossa vida?”
Ela parece
irrelevante para pessoas que acreditam ser capazes de realizar a trajetória de
vida por conta própria, i. é, segundo planos pessoais e com sua própria força.
Contudo, para quem sabe que somente andará no caminho certo e se posicionará na
vida no lugar correto e nas tarefas certas quando se deixar guiar por Deus,
essa questão é extremamente importante. Mas quando tentamos ser obedientes, ela
pode vir a ser muito difícil para nós: como, pois, reconhecemos a vontade de
Deus?
1 – Com muita frequência
experimentamos sua vontade diretamente através da palavra dele, que nos ordena
sermos verdadeiros, puros, conciliadores, não-egoístas e amorosos. “Ele te
declarou, ó homem, o que é bom e que é o que o Senhor pede de ti” (Mq 6.8).
2 – Às vezes
acontece, porém, de nos depararmos com uma encruzilhada e ambos os caminhos
diante de nós na realidade serem bons, p. ex., na questão da vocação que
devemos seguir em nossa vida. Em que lugar, afinal, Deus quer que estejamos? Em
At 16.6s é relatado como Paulo buscava um novo campo de trabalho. Inicialmente
pretendia dirigir-se para o sudoeste, à populosa província da Ásia em torno de
Éfeso. Mas “o Espírito Santo os impediu”. Então procurou um lugar para a ação
missionária ao norte, na região da Bitínia, e provavelmente também na margem
meridional do Mar Negro. “Mas o Espírito de Jesus não o permitiu”. Talvez Paulo
tenha se inquietado no íntimo quando pensava em ir até lá (possivelmente não se
limitou a pensar nisso), talvez tenha se angustiado na oração; não obteve
confirmação interior de seu plano. Para a condução espiritual de Deus é
importante permanecer “em prontidão”, em constante contato de oração. É assim
que dispomos do meio para a sinalização e orientação de Deus. Também Paulo não
recebeu “estoque de orientação para muitos anos”, mas apenas a ordem de não dar
o passo projetado. Não devemos nos admirar quando não obtemos uma clareza maior
no início. Diz Lutero, na retrospectiva de sua vida: “Deus me conduziu como um
matungo ofuscado.”
3 – No entanto, que
faremos se apesar de todas as nossas indagações e súplicas não obtivermos
resposta? Continuar no caminho em que estávamos (ou no único caminho que ainda
resta aberto). Foi precisamente o que também Paulo observou outrora na Ásia
Menor. E foi assim que o evangelho percorreu o importante caminho até a Europa.
Muitas vezes somos impacientes demais (François Poncet: “Os alemães são as
pessoas mais apressadas do mundo; isso já lhes custou caro.”) “Quando Jesus
silencia na alma, também tu precisas ter calma” (von Zinzendorf).
4 – Contudo, em
certos momentos temos de nos decidir, e que será então? Também Paulo finalmente
teve de tomar uma decisão quando chegou ao mar em Trôade. É possível que tenha
aguardado um sinal. E Deus lhe deu esse sinal. O sinal que Deus nos concede
pode ser: uma palavra da Bíblia com a qual nos deparamos e que fala de maneira
singular em nossa situação; uma porta nitidamente aberta (cf. 2Co 2.12)
enquanto outras portas e possibilidades continuam fechadas para nós; o conselho
de cristãos maduros, surgido da intercessão por nós; a circunstância de que
simplesmente somos necessários para determinadas tarefas. O sinal isolado,
porém, nunca é suficiente; necessário é que obtenhamos certeza no diálogo da
oração (não podemos interpretar algo precipitadamente como sinal de Deus,
principalmente quando confirma nossos próprios desejos. “Quando contraria a
natureza, então é que está no caminho certo” – G. Tersteegen). Importante é
obedecer imediatamente, porque do contrário tudo facilmente se dissipa e se
torna questionável o que a princípio ficou muito claro por parte de Deus e seu
Espírito (At 16.10 – “imediatamente”; At 8.27,30 – “ele correu”; Gn 22.3 –
“cedo”).
5 – O que faremos,
porém, quando não descobrimos nenhum sinal e quando até mesmo o conselho de
outros cristãos é contraditório e pouco convincente? Entregar mais uma vez a
vida inteiramente a Deus, para que disponha dela: “Aqui estou, faz de mim o que
te apraz!” Então lhe rogaremos: “Senhor, dirige tu os meus pensamentos e minhas
ponderações, as sábias e as tolas, de modo que assim se destaque tua vontade
boa, misericordiosa e salutar para mim e outros.” Por fim tomaremos a decisão
com confiança, segundo nosso mais depurado conhecimento e nossa consciência, da
melhor forma que pudermos decidir em nossa miopia humana. Quando isso acontece
com autenticidade, constatamos muitas vezes, ao olhar para trás, que nossas
decisões resultaram em mais acertos do que podíamos prever na época de nossa
decisão. “Guia-me pelas veredas da justiça” (Sl 23.3).
Fritz
Grunzweig. Comentário Esperança Carta De
Tiago. Editora Evangélica Esperança.
ELABORADO:
Pb Alessandro Silva.
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